Todo mundo quer acreditar que o amor é para sempre. Mas não adianta, é
infinito enquanto dura. E, quando termina só há um jeito. Acabar com o
casamento, definir direitos e deveres com relação aos filhos, partilhar
bens. Não há outra maneira de preservar o direito à felicidade.
Ainda assim, de forma para lá de injustificável, o Estado resiste em
permitir que as pessoas saiam do casamento. Antes o matrimônio era
indissolúvel: até que a morte os separe! Mesmo com o advento da Lei do
Divórcio, persiste a imposição de prazos, a identificação de culpados e a
necessidade de um duplo procedimento. Mesmo havendo consenso, primeiro é
preciso separar para depois converter a separação em divórcio, e isso
depois do decurso de um ano. A possibilidade de obter o divórcio direto
existe somente depois de dois anos da separação de fato. Ou seja,
ninguém consegue casar novamente antes de tais prazos. Pode viver em
união estável, mas não pode convertê-la em casamento.
Estas verdadeiras cláusulas de barreira são impostas sem se questionar
sequer se existem filhos ou interesses de ordem patrimonial. Isto é, as
pessoas são livres para casar, não para por fim ao casamento ou casar de
novo. Mas, a quem interessa a manutenção da união mesmo quando este nem
é o desejo dos cônjuges? Será que alguém ainda acredita que, como a
família é a base da sociedade, ela não pode se desfazer; renascer com
outro formato; reconfigurar-se com novos partícipes?
Para acabar com este verdadeiro calvário é que o Instituto Brasileiro de
Direito de Família (IBDFAM) apresentou o projeto que se transformou na
Proposta de Emenda Constitucional 22/2009, a chamada PEC do Divórcio,
que acaba com a separação, permanecendo o divórcio como a única forma de
dissolver a sociedade conjugal, sem ser necessário adimplemento de
prazos ou identificação de culpados. Com certeza esta é a única forma de
assegurar o respeito a um punhado de princípios constitucionais.
Obrigar alguém a permanecer casado afronta o respeito à dignidade
humana, o direito à liberdade, à convivência familiar e – às claras – o
direito fundamental à afetividade.
No entanto, mister atentar a um fato. A necessidade de esperar que flua
um lapso temporal desde o fim da vida em comum até a chancela estatal do
término da união prejudica especialmente a mulher e os filhos. De um
modo geral, quando da separação é a mulher que permanece com a guarda
dos filhos e o homem fica na administração do patrimônio. Quase sempre é
somente por ocasião do divórcio que ocorre a imposição de deveres, são
garantidos direitos e identificadas responsabilidades de ordem pessoal e
patrimonial.
Portanto, até serem fixados alimentos e partilhados os bens, o marido é
beneficiado com a perenização do estado de indefinição, pois, enquanto
isso, pode dispor livremente do patrimônio comum. E, quando finalmente o
divórcio se torna possível, muitas vezes não há mais vestígios dos bens
e nem o encargo alimentar atende ao critério da proporcionalidade. Tudo
foi consumido, vendido ou desviado. Ou seja, ela fica com os ônus e ele
com os bônus.
Talvez atentando a esta realidade seja possível identificar a quem
interessa as coisas ficarem como estão. Talvez sejam estes os motivos
que estejam a impedir a imediata aprovação da PEC do divórcio, que até
deveria ser chamada de PEC do casamento. Afinal, só depois do divórcio é
que as pessoas podem casar de novo. Mais uma vez, se faz necessário que
as mulheres se mobilizem para evitar que se perpetuem os enormes
prejuízos decorrentes da indefinição patrimonial gerada pela
injustificável resistência em chancelar o fim do vínculo afetivo.
A tentativa de manter o casamento acaba afrontando a dignidade feminina.