Apreensão foi o sentimento que aflorou com mais veemência quando tomou corpo a discussão em torno da redução das férias da magistratura para 30 dias, dado que hoje são de 60, sob a alegação de tratamento isonômico com os servidores e trabalhadores em geral. Na verdade, o que se apresenta é um jogo de palavras que esconde um intuito perverso, mesmo que a justificativa pareça, a princípio, simpática. A problemática suscitada em torno do tema é mais profunda do que aparenta, pois, de início, dá-se a impressão que seria justo e razoável se igualar as férias dos magistrados às dos trabalhadores em geral e, em especial, às dos servidores públicos que, raramente, possuem tais, digamos, privilégios. Entretanto, a discussão posta será em torno da inconstitucionalidade ou não da possibilidade de se reduzir direitos sociais, ou seja, se os direitos sociais são ou não cláusula pétrea; e isto é de interesse geral. Na espécie, se por acaso houver a redução de um direito social de uma classe de trabalhadores — pois os juízes não deixam de isto ser —, haverá a possibilidade de discussão e de redução de qualquer direito social, afinal, se houver o reconhecimento pelo Supremo Tribunal Federal da possibilidade de uma violação dos direitos de uma classe com grande poder, no caso, a Magistratura, o que ocorrerá com os direitos dos servidores públicos e, pior, com os direitos dos trabalhadores em geral? Tem-se acompanhado a discussão sobre o assunto de perto, tanto no Congresso Nacional, quanto no próprio Poder Judiciário e constata-se que há, na verdade, uma ação orquestrada de ataque aos direitos sociais em geral. Ou seja, trata-se de algo articulado e pensado, objetivando reduzir os direitos sociais, tendo em vista, principalmente, os dos trabalhadores privados, além do retorno de uma política de massacre e desprestígio do serviço público e do Estado brasileiro. No caso, vê-se que o assunto é sério e urgente, não é algo improvável de ser aprovado, mormente se não houver uma mobilização das associações de servidores em geral, dos sindicatos dos trabalhadores e dos que defendem que os direitos sociais não podem ser reduzidos em virtude das garantias constitucionais. Para finalizar, pode-se afirmar, sem medo de errar, que a proposta de redução das férias da magistratura é de interesse geral e, se aprovada e levada ao Supremo Tribunal Federal, o que se discutirá não é o privilégio ou característica própria de uma Carreira específica, no caso, os Juízes, mas sim, o início de um processo de desmonte de todo um sistema de direitos sociais duramente conquistados em torno da Constituinte e dos avanços posteriores alcançados. Portanto, é imperioso que todos se unam em torno da defesa das férias dos Juízes, pois, sua redução, na verdade, não será um ajuste legítimo, tendo em vista o aprimoramento da prestação jurisdicional, mas sim, a porta de entrada para a destruição das diversas garantias dos servidores e trabalhadores constantes da nossa Constituição. Deve-se avançar e ampliar os direitos sociais, nunca retroceder. – Ronald Bicca é presidente da Associação Nacional dos Procuradores de Estado, e membro da Comissão de Advocacia Pública do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil.
TRAGÉDIA ANUNCIADA – REDUÇÃO DE FÉRIAS DE JUÍZES AMEAÇA TRABALHADORES
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