A Fenajufe realizou neste fim de semana a 3ª edição do Encontro Nacional do Coletivo LGBTQIAPN+, no formato híbrido, com participação presencial em Brasília, na sede da Federação. O evento foi marcado por importantes debates para o segmento, reafirmando a importância da luta pela existência, garantia de direitos; bem como o acesso e permanência da população LGBTQIAPN+ em todos os espaços.
O encontro contou com a condução das coordenadoras-gerais Soraia Marca e Denise Carneiro, além da coordenadora Juliana Rick. Da base, participaram representantes dos sindicatos: Sinje/CE, Sintrajufe/CE, Sindjufe/BA, Sitraemg/MG, Sintrajud/SP, Sisejufe/RJ, Sintrajusc/SC, Sintrajufe/RS, Sindissétima/CE, Sindiquinze/SP, Sintrajuf/PE e Sindjuf/PB.
A primeira mesa tratou dos informes gerais e teve como painelista Alexandre Marques, assessor institucional da Fenajufe. Ele trouxe informações importantes, como o fato de que o segmento ainda é invisível no Poder Judiciário, com dados que apontam a existência de apenas 2% de pessoas identificadas como LGBTQIAPN+. Destacou também a importância de realizar um encontro com todos os líderes de sindicatos e representantes de coletivos LGBTQIAPN+ para elaborar propostas de políticas efetivas, que resultem em mudanças práticas e não apenas teóricas.
Justiça com Perspectiva de Gênero e Diversidade: Caminhos para o Reconhecimento e a Inclusão LGBTQIA+ no Sistema Judiciário
Dando continuidade aos debates, o painel trouxe as palestras de Ruth Venceremos, drag queen, produtora cultural, educadora e ativista, e de Naiara Malavolta – do Sintrajufe/RS e do Núcleo de Equidade de Gênero do CNJ.
Ruth Venceremos iniciou sua fala relembrando o início da luta LGBTQIAPN+, da invisibilidade e da importância do sentimento de pertencimento e comunidade para o segmento. Ratificou a necessidade de políticas públicas inclusivas, do combate às desigualdades e do respeito às identidades de gênero, fazendo um recorte do Judiciário. Alertou ainda que, para a transformação institucional, é necessária a organização da sociedade civil para pressionar e cobrar mudanças.
Já Naiara Malavolta relembrou o caso da vítima Márcia Barbosa, que foi ponto de partida para a criação do Protocolo com Perspectiva de Gênero elaborado pelo CNJ, considerado um passo fundamental para dar celeridade a julgamentos de casos como este. Ressaltou ainda a importância da participação da Federação no Fórum Nacional de Promoção dos Direitos das Pessoas LGBTQIA+ do CNJ e, ao final, enalteceu o papel dos sindicatos no Programa Governamental Pró-Equidade de Gênero.
Justiça com Inclusão: garantias e direitos das pessoas trans no Sistema Judiciário – banheiros, cotas, permanência e nome social como pilares de equidade
O terceiro painel trouxe as palestras de Luna Santos Leite, diretora Executiva da Articulação de Trabalhadoras/es Trans do Sistema de Justiça e Gregori Lucas – coordenador acadêmico do Rexistir – Núcleo LGBT da UNB e membro ouvinte da Comissão de Diversidade Sexual e de Gênero da OAB/DF.
Luna compartilhou sua trajetória como servidora trans no Sistema de Justiça: ainda jovem, antes mesmo da transição, enfrentou desrespeito ao nome social, restrição ao uso de banheiros e um contexto de violência e exclusão. A palestrante ressaltou que o Brasil, pelo 16º ano consecutivo, é o país que mais mata pessoas trans no mundo, e que a prostituição segue como principal ocupação devido à exclusão estrutural. Nesse ponto, apresentou conceitos como transfeminismo e cissexismo, chamando atenção para a incompreensão sobre o que realmente é violência contra pessoas trans. Para Luna, não se trata de uma fobia individual que poderia ser resolvida de forma individual, mas de um problema estrutural, econômico e institucional.
Na sequência, Gregori Lucas considerou falacioso afirmar que o Judiciário é “ativista”, quando a realidade mostra que pessoas trans continuam enfrentando barreiras para ter direitos básicos respeitados, como o uso do nome social ou o acesso a banheiros — como relatado por Luna. Ele destacou, ainda, que preservar a dignidade humana deve ser premissa inegociável e apontou as cotas trans, como um marco importante para garantir inclusão. No entanto, enfatizou que não basta assegurar apenas a entrada: é preciso que os espaços estejam preparados para acolher, permitindo a permanência e o pertencimento de pessoas trans com dignidade. Ressaltou ainda que os avanços institucionais no Judiciário não ocorreram por boa vontade de magistrados, mas foram fruto da luta e da ocupação de espaços de poder pela população LGBTQIAPN+.
Vozes que Inspiram: experiências de servidores LGBTQIAPN+ no serviço público
Fechando os debates, o último painel protagonizado por Gésner Braga (servidor da Justiça Federal da BA), Fer Lima e Joaquim Castrillon, do Sindiquinze/SP trouxe importantes perpectivas a partir das vivências compartilhadas.
Joaquim dividiu lembranças da infância, a descoberta da sexualidade e sua vivência como homem queer e servidor do Judiciário. Trouxe uma reflexão sobre autoconhecimento e como a criatividade pode ajudar nesse processo. Para ele, sem criatividade não há rebeldia, e sem rebeldia não existe liberdade.
Fer, mulher trans, relatou sua transição e as dificuldades de ser quem é dentro do Judiciário. Contou que nunca se sentiu livre para entrar nas varas ou mesmo para vestir-se como gostaria, sempre temendo represálias. Compartilhou os desafios enfrentados, o sentimento de apagamento ao longo da vida e as barreiras no exercício do cargo de oficiala de justiça. Ressaltou ainda a importância do acolhimento do coletivo LGBTQIAPN+ da Federação nesse processo.
Já Gésner relembrou sua entrada no Judiciário em 1992 e destacou que, naquela época, assumir a sexualidade como homem gay e ocupar espaços foi essencial para promover mudanças culturais em um setor tão conservador. Ele citou a organização de eventos artísticos que deram visibilidade à diversidade, mostrando que a Justiça Federal precisava reconhecer essa realidade entre seus servidores. Reforçou também que a luta deve ser contínua.
Após um dia intenso de debates, a Fenajufe encerrou a 3ª edição do Encontro Nacional do Coletivo LGBTQIAPN+ com a leitura e debate das propostas de encaminhamentos — todas foram acolhidas e agora serão analisadas pela Diretoria Executiva da Federação e divulgadas posteriormente.
Fenajufe