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O ASSÉDIO MORAL NO ESTÁGIO PROBATÓRIO

RESUMO

O presente trabalho aborda um tema muito presente nas relações de trabalho atuais e passadas – o assédio moral – com ênfase no período probatório destinado ao funcionário público. Apesar de ocorrer há muito tempo nas relações, a legislação é omissa nesse ponto, cabendo a Doutrina, jurisprudência e alguns projetos de lei encontrarem soluções para que se melhor possa dirimir este conflito que afeta não só os funcionários públicos, bem como trabalhadores das mais diversas classes.

Palavras-chave: Assédio moral. Legislação. Funcionários Públicos. Trabalhadores

INTRODUÇÃO

O tema que será abordado no presente estudo é tão antigo quanto o próprio trabalho – porém, sua discussão e problematização são bem atuais. O assédio moral (não só no âmbito do serviço público) é algo recorrente em relações trabalhistas, geralmente onde se verificam posições de hierarquia entre diretores e empregados, subordinados, etc.

O evento que aqui será abordado se caracteriza por condutas que evidenciam violência psicológica contra o empregado, de forma freqüente, podendo causar sérias conseqüências físicas e morais em quem sofre o assédio.

Tal situação pode ser fruto de diversos fatores: o desejo do empregador em obter lucro e sua imposição de trabalho repetitivo, cansativo e por vezes humilhante. Os empregadores exigem metas abusivas de seus empregados e criam ambientes de competitividade entre os mesmos – gerando situações propícias para desavenças. Toda essa pressão advinda dos empregadores é característica do sistema capitalista que domina o nosso país e nossas relações, fazendo com que muitas empresas – no intuito de obter o lucro – tratem seus funcionários como se máquinas fossem, ignorando o fato de os mesmos serem seres humanos que possuem desejos, ansiedades e problemas. Muitas vezes, ao serem inseridos neste contexto de freqüentes humilhações e represálias, os funcionários se tornam tímidos, inseguros, acoados e com sua autoestima extremamente baixa, se sujeitando a tal situação, pois temem ficar desempregados e/ou não possuem condições de pedir demissão.

A necessidade de se realizar o presente trabalho surgiu por haver um problema muito freqüente acerca do episódio aqui discutido: a lacuna que existe no tocante à Legislação, bem como punições para os agentes praticantes de tal violência. As conseqüências do assédio são muito significativas e podem afetar significativamente a saúde pública e o mercado de trabalho. Até o momento, leis estaduais e municipais foram criadas de maneira bem especifica em determinadas localidades, porém não há lei federal que regulamente conseqüências para os agressores praticantes de assédio moral no ambiente de trabalho – existindo apenas propostas de alteração no Código Penal e outros projetos de Lei. O Judiciário utiliza julgamentos análogos e jurisprudência como embasamento para aplicar punições aos mesmos. No intuito de tentar compreender o fenômeno em questão, serão abordadas as suas características, sua forma de ocorrência, bem como os agentes participantes.

1. A CONTEXTUALIZAÇÃO DO ASSÉDIO MORAL

Somos de uma cultura que já praticou a escravidão – Embora abolida pela Lei Áurea, há pessoas que ainda são adeptas ao trabalho exaustivo sem proporcionar ou visar meios adequados, bem como possuem uma visão de que os empregados são meros ‘objetos’ de seus empregadores.

O assédio moral é tema novo e atual, porém quando nos referimos ao vocábulo “novo”, o objetivo não é passar a idéia de que o tema vem acontecendo há pouco tempo – muito pelo contrário, pois ele ocorre há anos – justamente por essa cultura escravista que temos presente na nossa sociedade. O fenômeno que vem acontecendo é a popularização do termo e a proteção do trabalhador que sofre tal tipo de humilhação. Muitos trabalhadores sofreram quietos com medo de serem dispensados ou receberem algum tipo de sanção. Atualmente, vem sendo instaurada uma política diferente nas empresas, uma gestão de pessoas, que visa coibir comportamentos abusivos por parte dos empregadores. O judiciário já está atento a esse comportamento de igual forma, exarando decisões em favor das vítimas bem como aplicando indenizações de caráter pedagógico aos agressores.

Tal abuso tem recorrência histórica em todo o mundo, principalmente nas sociedades ocidentais industrializadas, onde o mercado de trabalho é um campo de batalha no qual muitos visam tirar vantagens, com melhores resultados, inobservando deveres éticos, de boa índole, dentre outros, que deveriam prevalecer sempre dentre as relações trabalhistas,

Desde os primórdios da humanidade e do surgimento do trabalho o assédio moral existe e participa do processo disciplinar: nos ofícios dos antigos artesãos; nos casos de escravidão; na Idade Média; nos setores industriais da Era Moderna pós-Revolução Industrial e perdura ainda e até hoje.

Geralmente nas relações de trabalho, há uma parte que é mais vulnerável – circunstância esta que geralmente opera-se na figura do empregado (razão pela qual a Justiça do Trabalho é inclinada a defender os interesses do mesmo, ou seja, é adepta do “in dubio pro operário”). O empregador, o chefe, o patrão, geralmente por serem detentores de mais autonomia e autoridade, aproveita-se de tais atribuições para intimidar e pressionar os seus empregados – configurando o tipo de assédio mais comum, este que é chamado de assédio moral vertical descendente. Os empregados, por sua vez, aceitam o abuso por medo de serem prejudicados e/ou perderem seus empregos.

Note-se não há uma regra para o assédio moral ocorrer no tocante aos sujeitos da situação. A mesma pode se dar entre agentes do mesmo nível hierárquico dentro do ambiente de trabalho, caracterizando o chamado assédio moral horizontal ou transversal, que pode ocorrer de maneira simples – quando praticado por um colega, geralmente quando há disputa de cargos, promoções dentre outros conflitos que podem surgir no ambiente de trabalho – bem como da forma coletiva, quando um grupo se reúne para atacar um colega específico, seja pelos mais diversos motivos.

Outro tipo de assédio moral, classificado pelos doutrinadores e visto como o mais raro é o assédio moral da forma vertical ascendente, onde o empregado adota um comportamento abusivo em relação ao empregador e, geralmente age em grupos – pois é mais difícil que só um empregado desestabilize um empregador.

O que caracteriza o assédio moral é a sua repetitividade e prolongação das atitudes ofensivas direcionadas à vítima pelo agressor. Deve haver o desejo do mesmo de prejudicar a vítima de forma psíquica ou moral para desestabilizar o emprego, fator este que é responsável por ocasionar desestruturação na vida do mesmo, resultando em alguma patologia de ordem moral, danos psíquicos, dentre outros.

Conforme definição de Márcia Novaes Guedes a expressão “Assediar” significa:

Assediar, portanto, é submeter alguém, sem tréguas, a ataques repetidos requerendo, assim, a insistência, a repetição de condutas, procedimentos, atos e palavras, inadequadas e intempestivas, comentários perniciosos e críticas e piadas inoportunas, com o propósito de expor alguém a situações incômodas e humilhantes. Há certa invasão da intimidade da vítima, mas não em decorrência do emprego abusivo do poder diretivo do empregador, visando proteger o patrimônio da empresa, mas sim deriva de conduta deliberativa com o objetivo de destruir a vitima e afastá-la do mundo do trabalho. (GUEDES, 2003: p. 33).

O instituto ora discutido não é presente e recorrente só no Brasil, tendo definições em outros países, que já noticiaram a sua ocorrência em diversos setores e tipos de relações trabalhistas. São as definições pelo mundo:

· Harcèlement moral (assédio moral), na França;

· Bullying (tiranizar), na Inglaterra;

· Mobbing (molestar), nos Estados Unidos e na Suécia;

· Murahachibu, ijime (ostracismo social), no Japão;

· Psicoterror laboral, acoso moral (psicoterror laboral, assédio moral), na Espanha.

Conforme ensinamento de Marie-France Hirigoyen (2006) entende-se por assédio em um local de trabalho todo e qualquer comportamento abusivo apresentando-se, sobretudo, por atos, palavras, gestos, escritos que possam ensejar danos à dignidade, à personalidade ou à integridade física ou psíquica de um indivíduo, pôr em risco sua atividade profissional ou tornar o ambiente de trabalho degradante.

Carmen Feijó (2007), na matéria especial: assédio moral na Justiça do Trabalho veiculada no TST (Tribunal Superior do Trabalho) conceitua o assédio moral como violência psicológica, constrangimento e humilhação, sendo estes os ingredientes básicos para a definição do quadro inerentes às relações humanas, sobretudo no mundo do trabalho.

Neste diapasão, oportuno mencionar que o assédio moral está claramente ligado à violação do principio constitucional da dignidade da pessoa humana, previsto no art 1º, III da Constituição Federal – este que é tido como inerente ao ser humano e não como um direito concedido pelo ordenamento jurídico – e é exatamente nesse fundamento que se embasa a violação do referido principio. Todas as pessoas devem ser tratadas com dignidade. Tal princípio não comporta gradações entre as mesmas, não havendo níveis de dignidade atribuídos aos indivíduos por possuírem características ou posições diferentes. A luz da nossa na Carta Magna, todos são iguais e merecem ser tratados com a mesma dignidade. A noção de desse princípio deve ser adotada de maneira totalmente abrangente e aplicada em todos os aspectos da vida.

Cleber Francisco Alves[1] ressalta que Kant atribui um tratamento diferenciado à dignidade da pessoa humana, tendo em vista que enfoca a dimensão individual da personalidade humana e a sua dimensão comunitária social. Agir com abuso de poder e de maneira exacerbada, ultrapassando as atribuições profissionais e em conseqüência gerar um dano à vida da vítima caracteriza assédio moral – configurando grave violação ao principio supra referido.

A prática de tal atitude pode comprometer a capacidade laboral do indivíduo, gerar patologias físicas e psíquicas, bem como afetar significativamente sua vida, tendo o Órgão empregador responsabilidade civil objetiva quando da reparação de danos, ficando responsável por reparar em obrigação pecuniária, tanto na esfera moral – abalos psíquicos que possam ensejar síndrome do pânico, vergonha, frustração, dentre outros sentimentos – bem como na esfera patrimonial – gastos com tratamento, perda de capacidade laboral e incapacidade para reintegração ao mercado de trabalho, dentre outros que o emprego possa vir a sofrer. O Relator Leonardo Meurer Brasil, no julgamento de Recurso Ordinário[2], entende assédio moral como situações constrangedoras sofridas pela vítima no ambiente de trabalho, corroborando os argumentos aqui trazidos. São as palavras do Nobre Julgador:

ASSÉDIO MORAL.

O assédio moral no trabalho é espécie do gênero dano moral, sendo também instituto conhecido como hostilização ou assédio psicológico no trabalho. Configura-se quando o empregado é exposto, pelo empregador, a situações humilhantes e constrangedoras durante a jornada laboral, a provocarem no empregado sentimento de humilhação, menosprezo e desvalorização. Recurso da reclamante desprovido. (…)

Conforme Lydia Guevara Ramírez[3] – secretária da Diretoria Nacional Sociedade Cubana de Direito do Trabalho e Seguridade Social: “A última década do século XX e os inícios do século XXI se caracterizam pela notável influência da violência psicológica e os estragos causados na saúde emocional na comunidade e nos lugares de estudo e de trabalho”.

A Relatora Nova Moreira no julgamento de Recurso Ordinário[4], em processo análogo entendeu devida a indenização quando da ocorrência de assédio moral no ambiente de trabalho – este que se caracteriza pelo tratamento depreciativo conferido a determinados empregados. Nesse sentido:

1. RECURSO ORDINÁRIO EMPRESARIAL. ASSÉDIO MORAL. CONSTATADO, PELO CONJUNTO PROBATÓRIO DOS AUTOS, TRATAMENTO DEPRECIATIVO POR PARTE DE PREPOSTO DA EMPRESA – AÍ INCLUSA A UTILIZAÇÃO DE PALAVRAS DE BAIXO CALÃO EM REUNIÕES DIÁRIAS – FORÇOSO CONCLUIR PELA OCORRÊNCIA DE ASSÉDIO MORAL, O QUE ENSEJA CONDENAÇÃO EM INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. RECURSO NÃO PROVIDO.

2. RECURSO ORDINÁRIO DA LITISCONSORTE. RESPONSABILIZAÇÃO. A RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA DO TOMADOR DE SERVIÇOS ABRANGE TODAS AS VERBAS DECORRENTES DA CONDENAÇÃO REFERENTES AO PERÍODO DA PRESTAÇÃO LABORAL (SÚMULA Nº 331, VI, DO C. TST). APELO NÃO PROVIDO.

2. O ASSÉDIO MORAL NO ÂMBITO DO ESTÁGIO PROBATÓRIO DOS SERVIDORES PÚBLICOS

Inicialmente, necessário estabelecermos a definição de servidor público. De acordo com o artigo 2º da Lei 8.112/90, servidor é a pessoa legalmente investida em cargo público. E diante disso, é sabido que todas as pessoas que ingressam em carreiras públicas só adquirem estabilidade após vencerem o período de estágio probatório – este que é de 03 anos, conforme artigo 41 da Constituição Federal

Art. 41. São estáveis após três anos de efetivo exercício os servidores nomeados para cargo de provimento efetivo em virtude de concurso público.

No regime jurídico estatutário federalbrasileiro, o estágio probatório é o período pelo qual um servidor público concursado de provimento efetivo deve passar por um processo de avaliação no cargo. São analisadas as características do candidato, no intuito de constatar se o mesmo possui reais condições para permanecer e exercer determinada função, além de outros atributos. Se o servidor passar do estágio probatório, o mesmo adquire a estabilidade no cargo, onde não poderá ser exonerado, salvo em caso de ato infracionário de natureza grave.

Durante o estágio probatório é imprescindível que o servidor tenha o dobro de cuidado e responsabilidade em suas atribuições profissionais, pois como o próprio nome já remete, o mesmo está em um momento de prova, de se adaptar às novas funções, aos seus colegas de trabalho e com a rotina do seu serviço público. Cumpre enfatizar que o servidor encontra-se em uma situação mais vulnerável, visto que quando do cumprimento do referido estágio, não adquiriu sua estabilidade ainda e necessita cumprir suas tarefas com o máximo de atenção e comprometimento.

Em virtude dessa circunstância de vulnerabilidade, vislumbra-se haver mais facilidade para se instaurar o fenômeno do assédio moral, visto que o detentor de maior autonomia pode se “aproveitar” da situação que se encontra o servidor público em estágio probatório. A cobrança pode se tornar maior afetando a condição e o trabalho do servidor. Note-se que a legislação é omissa no assunto aqui discutido – não há na Consolidação das Leis Trabalhistas ou na Constituição Federal, dispositivo expresso que proíba ou aplique penas para os agressores que pratiquem. Porém, no Estado de São Paulo, em virtude de situações de assédio moral que vem sendo recorrente nas relações de trabalho, foi aprovada a Lei 12.250/06, no âmbito da Administração Pública Direta e Indireta, vedando a prática do assédio moral e atribuindo sanções para os agentes que praticarem ações humilhantes ou agressivas às vítimas. Assim dispõe o artigo 1º do texto legal:

Artigo 1º – Fica vedado o assédio moral no âmbito da Administração pública estadual direta, indireta e funções públicas, submetendo o servidor a procedimentos repetitivos que impliquem em violação de sua dignidade ou, por qualquer forma, que o sujeitem a condições de trabalho humilhante ou degradantes.

No artigo 2º restam discriminadas as atitudes vexatórias que são consideradas para configuração do instituto do Assédio Moral, in verbis

Artigo 2º – Considera-se assédio moral para os fins da presente lei, toda ação, gesto ou palavra, praticada de forma repetitiva por agente, servidor, empregado, ou qualquer pessoa que, abusando da autoridade que lhe confere suas funções, tenha por objetivo ou efeito atingir a auto-estima e a autodeterminação do servidor, com danos ao ambiente de trabalho, ao serviço prestado ao público e ao próprio usuário, bem como à evolução, à carreira e à estabilidade funcionais do servidor, especialmente:

I – determinando o cumprimento de atribuições estranhas ou de atividades incompatíveis com o cargo que ocupa, ou em condições e prazos inexeqüíveis;

II – designando para o exercício de funções triviais o exercente de funções técnicas, especializadas, ou aquelas para as quais, de qualquer forma, exijam treinamento e conhecimento específicos;

III – apropriando-se do crédito de idéias, propostas, projetos ou de qualquer trabalho de outrem.

Tal comportamento não tem sido tolerado pelo poder Judiciário, que vem arbitrando indenizações em favor das vítimas quando comprovado o efetivo dando sofrido. O assédio moral, mais do que apenas uma provocação no local de trabalho – como sarcasmo, crítica, zombaria e trote –, é uma campanha psicológica com o objetivo de fazer da vítima uma pessoa rejeitada. Ela é submetida à difamação, abusos verbais, agressões e tratamento frio e impessoal. Nesse sentido, decidiu o Superior Tribunal de Justiça

ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. ASSÉDIO MORAL. VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. ART. 11 DA LEI 8.429/1992. ENQUADRAMENTO. CONDUTA QUE EXTRAPOLA MERA IRREGULARIDADE. ELEMENTO SUBJETIVO. DOLO GENÉRICO. 1. O ilícito previsto no art. 11 da Lei 8.249/1992 dispensa a prova de dano, segundo a jurisprudência do STJ. 2. Não se enquadra como ofensa aos princípios da administração pública (art. 11 da LIA) a mera irregularidade, não revestida do elemento subjetivo convincente (dolo genérico). 3. O assédio moral, mais do que provocações no local de trabalho – sarcasmo, crítica, zombaria e trote -, é campanha de terror psicológico pela rejeição. 4. A prática de assédio moral enquadra-se na conduta prevista no art. 11, caput, da Lei de Improbidade Administrativa, em razão do evidente abuso de poder, desvio de finalidade e malferimento à impessoalidade, ao agir deliberadamente em prejuízo de alguém. 5. A Lei 8.429/1992 objetiva coibir, punir e/ou afastar da Atividade pública os agentes que demonstrem caráter incompatível com a natureza da atividade desenvolvida. 6. Esse tipo de ato, para configurar-se como ato de improbidade exige a demonstração do elemento subjetivo, a título de dolo lato sensu ou genérico, presente na hipótese. 7. Recurso especial provido.

Em Outubro de 2013, foi apresentado pelo Presidente da Comissão de Direitos Humanos Marcos Feliciano, um projeto de Lei, que pune o assédio moral e o abuso de autoridade no funcionalismo na Administração Pública Direta e Indireta, em virtude das milhares de denúncias que a Comissão vem recebendo de servidores que sofrem esse tipo de agressão. Importante ressaltar que quanto mais o assédio moral é praticado, as conseqüências não se aplicam somente ao ofendido e sim a toda a população, pois tal comportamento enseja maiores números de aposentadorias precoces e licenças para tratamento de saúde, desestabilizando o mercado de trabalho e suas relações. Procedendo a uma análise do problema sob uma ótica mais grave, atentemo-nos para os casos de suicídio que a mídia vem noticiando em razão de pressões e assédios reiteradamente sofridos por empregados, por toda a parte do mundo.

Independentemente de o assédio ocorrer no serviço público ou nas relações privadas, ele possui as mesmas características e é causador de sérias conseqüências, inclusive desejo de suicídio às vitimas. O Senador Inácio Arruda também apresentou projeto de lei com o objetivo de punir tal prática, argumentando da seguinte forma

Segundo a OIT [Organização Internacional do Trabalho] e a Organização Mundial da Saúde, as perspectivas não são boas, pois nas próximas décadas predominarão vários danos psíquicos relacionados com as novas políticas de gestão na organização de trabalho.

O objetivo do senador ao apresentar o projeto, é que seja incluída a sanção de demissão ao artigo 132 da Lei 8.112/90, que regula o Regime Jurídico dos servidores públicos da União, autarquias e fundações. O Ministro Lélio Bentes Côrrea, do Tribunal Superior do Trabalho, entende que tal projeto servirá para encaixar no texto legal, o que a jurisprudência vem aplicando ao julgar as demandas que envolvam assédio moral.

2.1 A REGULAMENTAÇÃO LEGAL DO ASSÉDIO MORAL NO DIREITO BRASILEIRO

De acordo com os argumentos exaustivamente elencados, sabe-se que nosso País não possui Lei Federal que regulamente os casos de assédio moral, porém existem mais de 11 projetos de lei em trâmite perante o Congresso Nacional para tentar solucionar o problema, com a aplicação de sanções e medidas para tentar reduzir o comportamento agressivo por parte dos envolvidos em relações de trabalho.

A competência para legislar a respeito de direito do trabalho é privativa da União, consoante o artigo 22, I da Constituição Federal. A solução mais adequada seria uma lei federal inserida na Consolidação das Leis Trabalhistas que tivesse previsão expressa acerca de tal prática bem como punições aplicáveis aos seus praticantes, no âmbito das relações trabalhistas. Alguns estados já possuem legislação própria para conter a atitude, como o caso do Rio Grande do Sul (Lei Complementar n. 12.561/2006), Rio de Janeiro (Lei n. 7.121/2022), Distrito Federal (2.349/2002) São Paulo (Lei n. 422/2011), Goiás (Lei n. 11.561/2010) e Mato Grosso (Lei Complementar n. 04/1990).

Enquanto o legislativo e executivo permanecem omissos no ponto aqui discutido, o judiciário auxilia-se de julgamentos análogos, entendendo o assédio moral como falta grave, passível de ensejar a perda da estabilidade no emprego, sendo considerado como justa causa para a rescisão do contrato de trabalho do empregado agressor, consoante o art. 482, b, da Consolidação das Leis Trabalhistas.

Sob o viés de responsabilidade atribuída ao agressor no âmbito da Administração Pública, podemos elencar o artigo 37, § 6º da Constituição Federal, que possui a seguinte redação:

As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.

A conclusão é de que todos os danos causados às vitimas no âmbito da Administração Pública, devem ser reparados. Essa reparação pode abranger os traumas de natureza psíquica e física, dependendo do que for aplicável ao caso concreto.

3. DO ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIAL ACERCA DO TEMA ORA DEBATIDO

Segundo já foi relatado, o fenômeno do assédio moral não é nada atual – este é tão antigo quanto o instituto do trabalho – o que é atual e contemporâneo, é a sua popularidade. Como nosso país não adotou Lei Federal especifica que regule tal contexto, o judiciário estabelece certas diretrizes e entendimentos semelhantes para julgar ações que discutam o assédio moral, valendo-se de normas subsidiárias de outros textos legais ou entendimentos de grandes Doutrinadores e especialistas no assunto.

O argumento basilar que condena o assédio moral funda-se nos princípios constitucionais, que não permitem qualquer tipo de violação à intimidade, dignidade, honra vida privada e imagem das pessoas, não podendo uma determinada pessoa ou determina empresa pública ou privada desrespeitar os mesmos, sob pena de ter de reparar o dano.

A 3ª turma do Tribunal Regional do Trabalho, assim entendeu:

Na hipótese dos autos, o Regional, analisando os elementos instrutórios dos autos, concluiu que restou configurada a prática de assédio moral (dano, nexo causal e ação culposa do Réu), razão pela qual manteve a condenação do Reclamado ao pagamento de indenização a tal título. A sujeição da Autora a tais práticas, não pode haver dúvidas, compromete a sua imagem perante seus colegas de trabalho, pois nele desenvolve, presumidamente, sentimento negativo de incapacidade profissional.

Ressalte-se, ainda, que as perseguições psicológicas ou pressões descomedidas formam grupos de trabalho desmotivados, sem condições de executar metas ou projetos em quantidade e com qualidade. (…)” (grifo nosso)

Quando do julgamento do acórdão de recurso ordinário no processo 0000890-04.0014.2.09.5522[5], ficou reconhecido o assédio moral e seu caráter ilícito. Assim dispõe a ementa:

ASSÉDIO MORAL. Hipótese em que comprovados os fatos que configuram assédio moral sofrido pelo reclamante. Caracterizados o ato ilícito e a responsabilidade civil do empregador, em razão da omissão em coibir o comportamento abusivo dos seus empregados ou prepostos, nos termos do art. 186 do Código Civil.

Assim foi o entendimento da Exa. Sra. Desembargadora Carmen Gonzáles, relatora do processo supracitado, corroborando todas as informações aqui trazidas:

Ainda, o assédio moral ou psico terrorismo é a exposição do trabalhador a situações humilhantes e constrangedoras, repetitivas e prolongadas, durante a jornada de trabalho ou no exercício das funções profissionais. Em muitos casos, essas situações, se fossem isoladas, seriam irrelevantes, ou toleráveis. Entretanto, por estarem ligadas entre si (objetivo convergente), elas se tornam não apenas juridicamente relevantes como também, em muitos casos, mais graves do que outras que poderiam parecer, à primeira vista, mais ofensivas.

No caso dos autos, entendo que a prova oral é suficientemente robusta para confirmar a veracidade de fatos alegados na peça inicial que constituem conduta abusiva do empregador, por seu preposto, repetitiva e velada, caracterizando assédio moral indenizável.

Da análise de julgados que versam acerca do tema em comento, a conclusão que se chega é que o entendimento é unânime: embora a legislação seja omissa, aplica-se subsidiariamente os preceitos estabelecidos no Código Civil de 2002, ao caracterizar o assédio moral como um ilícito civil que deve ser reparado, independentemente de ocorrer no âmbito público ou privado.

O assunto é antigo, possui bastante ocorrência, porém até quando a legislação se manterá omissa? Em que momento as vítimas do assédio moral terão segurança jurídica para não mais aceitarem esse comportamento dos agressores e conseguirão ter seus direitos constitucionais devidamente reconhecidos? Somente quando se criar uma lei especifica – que tenha como objetivo punições severas para os praticantes do assédio – que se aproveitam dessa lacuna do direito brasileiro para exercerem sua malevolência para com os sujeitos mais vulneráveis nas relações trabalhistas.

CONCLUSÃO

O resultado da pesquisa feita nos remete a muitas conclusões acerca do assédio moral. Ele decorre por diversas circunstâncias, mas o que mais se pode apurar é que geralmente os indivíduos que sofrem o assedio estão em situações hierarquicamente inferiores e são mais frágeis. Ele vem sendo utilizado de maneira sofisticada, muitas vezes em grandes empresas, de forma sutil, sem que outros empregados percebam, para não comprometê-los.

A conseqüência do assédio está muito ligada ao modelo de relações trabalhistas que existem, onde o chefe sofre pressão de seus superiores e esse mesmo chefe impõe pressão aos seus subordinados, gerando uma corrente, onde cobranças são feitas de todos os lados. O sistema capitalista que objetiva o lucro, acaba esquecendo que as pessoas ainda são pessoas e possuem sentimentos e emoções – necessitam ter suas necessidades e dignidades respeitadas – diferentes das máquinas, que são executadas de maneira interrupta, sem o dever de amparo psicológico.

Não é só a vítima que percebe as conseqüências do instituto e sim todo o estado, visto que as empresas públicas e privadas, bem como os seus resultados são partes integrantes do mesmo. Quando algo não vai bem, as conseqüências são para um todo. Todas as pessoas que fazem parte da sociedade são de uma forma ou de outra, responsáveis pelo funcionamento da mesma, executando suas funções individuais e coletivas. Um empregado que sofre assédio moral está propenso a desenvolver doenças psicossomáticas e até físicas em função do sofrimento experimentado, comprometendo sua capacidade laboral e desenvolvimento.

Ao ser acometido de doença incapacitante, o emprego se retira e se afasta, necessitando o estado dispor de recursos para subsidiar o indivíduo que não está trabalhando, mas está gerando despesas com saúde e tratamentos. Portanto, conclui-se: não é só o empregado que fica doente e sim toda a sociedade que ele faz parte. A produção pode diminuir com a recorrência do assédio e prejudicar visivelmente uma empresa, de igual forma.

Indubitável que o direito brasileiro necessita mais do que nunca de uma legislação que seja capaz de intimidar os praticantes do assédio, para talvez tentar reduzir os casos ou para que as vítimas se sintam mais confiáveis e seguras para enfrentarem o problema – seja administrativamente ou judicialmente, sem colocarem em risco as suas carreiras e seu desenvolvimento, bem como a criação de punições também será benéfica para o estado, que conforme já relatado, adoece na mesma medida em que os seus trabalhadores têm sua produção reduzida ou quando são afastados para tentar curar todas as humilhações e represálias que sofreram por algum tempo.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1. GUEDES, Márcia Novaes. Terror Psicológico no Trabalho, São Paulo: LTR, 2003, p. 37.

2. HIRIGOYEN, Marie-France. Mal-Estar no Trabalho – Redefinindo o Assédio Moral. Rio de Janeiro: Betrand Brasil, 2002.

3. ALVES, Cleber Francisco. O Princípio Constitucional da Dignidade da Pessoa Humana: O Enfoque da Doutrina Social da Igreja. Rio de Janeiro: Renovar, 2001, p. 1-9

Recurso Ordinário zero RS 1083600-14.0008.2.09.0271 – Vara do Trabalho de Osório – Data de Julgamento 20/10/2011

Processo Nº: 0000174-4.2.19.5014.0001 – Recurso Ordinário (069) Desembargador Relator Nova Moreira

BRASIL. LEI 9.212 de 24/07/1991 – Dispõe sobre a organização da Seguridade Social, institui Plano de Custeio, e dá outras providências.

Lei 12250/06 | Lei Nº 1donatellacmaia@gmail. Com50, de 9 de fevereiro de 2006 do São Paulo. Veda o assédio moral no âmbito da administração pública estadual direta, indireta e fundações públicas.

Recurso Especial nº 1286466/RS – STJ – Data 03/09/2013 – Relatora: Ministra Eliana Calmon

BRASIL. Tribunal Superior do Trabalho. Agravo de Instrumento em Recurso de Revista. 203804-40.0006.2.01.5007, 2ª turma. Relator: Min. Renato de Lacerda Paiva. Brasília, DF

BRASIL. Constituição (1988). Constituição [da] Republica Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal.

[1]ALVES, Cleber Francisco. O Princípio Constitucional da Dignidade da Pessoa Humana: O Enfoque da Doutrina Social da Igreja. Rio de Janeiro: Renovar, 2001, p. 1-9.

 [2]Recurso Ordinário zero RS 1083600-14.000{{PRESERVE}}.0{{PRESERVE}}271 – Vara do Trabalho de Osório – Data de Julgamento 20/10/2011

 [3]A Dra. Lydia Guevara Ramires apresentou um dos primeiros grandes trabalhos sob o título de “Reflexões sobre o assédio moral no trabalho”, em sua Conferência proferida no IV Encuentro Interamericano de Derecho Laboral Y Seguridade Social, realizado em Cuba, de 24 a 28 de março/02.

 [4] Processo Nº: 0000174-{{PRESERVE}}.1{{PRESERVE}}01{{PRESERVE}}001 – Recurso Ordinário (069) Desembargador Relator Nova Moreira

 [5]Acórdão do processo 0000890-0{{PRESERVE}}01{{PRESERVE}}.0{{PRESERVE}}522 (RO) Data:08/08/2013 Origem: 2ª Vara do Trabalho de ErechimRedator:CARMEN GONZALEZ