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TELETRABALHO : NOVA FORMA DE EXPLORAÇÃO

Nessa modalidade, as metas exigidas são em média 15% superiores àquelas estipuladas no trabalho convencional – Denise Carneiro*

Home office, título bonito para nova forma de exploração, dessa vez ainda mais maquiada de vantagem. Anywhere office, home office ou teletrabalho é o trabalho realizado em domicílio do empregado, pelo empregado. Essa forma de exploração já está consolidada em alguns setores, aumentando o estresse dos trabalhadores, que vêem suas residências invadidas por tarefas da empresa.

No Poder Judiciário, principalmente nos TRTs, essa forma de trabalho já alcança alguma percentagem do número de servidores, pois já está regulamentada pelo TST desde fevereiro de Nessa modalidade de trabalho as metas exigidas dos servidores são em média 15% superiores àquelas estipuladas para os trabalho convencional, feitas na Unidade. Com o serviço invadindo o espaço da família do servidor, estes tendem a perder qualidade de vida, pois, a invasão do trabalho formal no seu ambiente de lazer e descanso confunde o servidor e sua família sobre quando ele está trabalhando e quando não está, quando pode ser, por exemplo, solicitado pelos filhos, amigos e parentes e quando não pode ou não deveria sê-lo. Isso, com o passar dos anos pode influenciar até o metabolismo do servidor e suas relações sociais e emocionais.

Outro fator que, sob a ótica do empregador, é positivo é o afastamento do servidor do seu ambiente coletivo de trabalho e seu conseqüente isolamento dos colegas, perdendo vínculo pessoal com eles. Para os sindicatos, o home office seria uma forma engenhosa para “furar” e enfraquecer as mobilizações, reivindicações e greves da categoria, além de maquiar as relações de trabalho, fazendo o servidor ser mais explorado com a ilusão de estar sendo beneficiado.

Na iniciativa privada, essa forma de trabalho, em alguns casos, está descaracterizando os contratos de trabalho com tentativas de maior flexibilização de direitos, como contrapartida à “permissão” do trabalho em casa.

Mecanismo simbólico de controle – Segundo a pesquisadora Márcia Regina Castro Barroso (cientista social, doutoranda em sociologia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro), o trabalho à distância tem mecanismos simbólicos de controle. “Vende-se um pacote de expectativas e vantagens, mas o que a pesquisa percebe é que a liberdade e a autonomia não têm muita expressividade. O teletrabalhador tem um sentimento de dívida constante. A possibilidade de flexibilização de horário de trabalho e alguns mimos cotidianos se esvai. O que acaba ocorrendo é a indiferenciação da vida privada da laboral”, destaca a pesquisadora.

Outra pesquisadora do mundo do trabalho, a auditora fiscal Vera Teresa Balieiro, ao entrevistar servidores para saber como encaram o quadro de precarização de seu universo laboral, registrou a angústia de uma servidora da Justiça, por não dar conta das demandas que aumentam numa época em que os servidores diminuem, numericamente: “Hoje, para trabalhar direito, eu não poderia cumprir a meta”.

Novos instrumentos de controle são adotados para monitorar a produtividade, independentemente da carga horária trabalhada efetivamente, ou seja, o período em que o trabalhador esteve “logado” nos sistemas remotos. Assim, a carga horária efetiva tende a ser sempre maior do que a registrada e, obviamente, esta não será remunerada. A avaliação do servidor é meramente quantitativa, mecânica, colocam sobre seus ombros a responsabilidade pela sua parte do trabalho.

Essa responsabilização aumenta a culpabilização quando o servidor não consegue cumprir as metas. E no isolamento, sem convívio com os colegas, perde-se referências importantes sobre a essência do serviço, qualidade de vida, etc.

Grandes desvantagens mascaradas de pequenas vantagens – Pequenas vantagens como evitar o trânsito caótico das grandes cidades, não precisar cumprir horário rígido, evitar a convivência com chefias e assim evitar assédios, etc,. se revelam grandes desvantagens quando se desmascaram esses argumentos, pois a economia no tempo gasto com o trânsito é utilizada para a execução de tarefas do trabalho e os custos da estrutura necessária passam a ser da sua responsabilidade.

O horário não é rígido, mas se revela costumeiramente maior que a carga horária obrigatória. O afastamento das chefias não impede a ocorrência de pressões e estabelecimentos de metas cada vez mais inatingíveis, o que é um dos aspectos do assédio moral. O servidor passa a ser apenas um número e fornecedor de números nas estatísticas, sem colegas, sem identidade de classe nem categoria, despessoalizando-o totalmente. É o avanço do mundo do trabalho se incorporando inexoravelmente ao espaço privado e pessoal do servidor.

O filósofo Theodor Adorno (1903-1969), considera a liberdade na sociedade atual como meramente formal. Para ele a “razão” se apresenta como o “deus da cultura que visa unificar os seres em suas diferenças em nome do progresso. O preço desse progresso é a subjugação de muitos por poucos, do próprio ser à razão, assim através dessa razão as diferenças qualitativas entre os humanos são perdidas em nome de uma eficácia padronizante”. Com a padronização do comportamento como elemento de aumento da eficácia e do rendimento do indivíduo, o indivíduo obedece a uma lógica de máquina.

* Denise Carneiro é coordenadora de Formação Política e Políticas Públicas do Sindjufe-BA