Depois de uma tarde de muito debate no Plenário da Câmara dos Deputados nesta quarta-feira, a votação do projeto de lei que cria o fundo de previdência complementar do servidor público (Funpresp – PL 1992/07) foi adiada para a próxima terça-feira (14). Além da obstrução dos partidos oposicionistas e de manifestantes na Casa, o governo teve de lidar com o descontentamento de aliados, como o PDT, que declarou voto contrário à proposta.
A polêmica em relação à votação do fundo inviabilizou até mesmo a análise de propostas consensuais entre os partidos, como a proposta que garante proventos integrais a servidores aposentados por invalidez (PEC 270/08).
Negando qualquer crise na base, o líder do governo, deputado Cândido Vaccarezza (PT-SP), disse que o adiamento da votação foi uma decisão unilateral do presidente da Câmara, Marco Maia. O governista fez questão de ressaltar que a base contava com o apoio de cerca de 308 deputados, ou seja, número suficiente para aprovar o Funpresp, que precisa de apenas 257 votos favoráveis.“Foi uma decisão unilateral do presidente Marco Maia [o encerramento da sessão], mas o governo não está contrariado com a decisão. É uma questão específica, pontual, e já me adianto a dizer que não considero isso uma crise na Câmara”, afirmou.
Para o líder do PT, deputado Jilmar Tatto (SP), adiar a votação do Funpresp foi uma decisão “prudente”. “Com uma boa conversa no início da semana, nós podemos entrar no Plenário acordados para votar a matéria, discutir o mérito e não o encaminhamento”, analisou.
Dissidência na base - A criação da previdência complementar do servidor público tem a contrariedade do PDT, que pertence à base de apoio à presidente Dilma Rousseff. O líder do partido, deputado André Figueiredo (CE), disse que a legenda vai se juntar à oposição na obstrução à matéria. “Consideramos a tentativa de votação no dia de hoje um açodamento, uma traição a partidos como o PDT, que sempre foram leais. Não fomos consultados sobre essa votação e vamos obstruir o Funpresp”, ressaltou. Figueiredo disse ainda que o PDT tem propostas alternativas, que foram discutidas na comissão geral sobre o tema, realizada em dezembro. Vaccarezza afirmou que o PDT tem o direito de votar contra o projeto, mas que vai “dialogar à exaustão para mostrar que eles não estão agindo de forma correta com o governo”.
Acordo frustrado - Alguns oposicionistas criticaram o fracasso do acordo sugerido ontem pelo PSDB para votar o Funpresp apenas depois do Carnaval, nos dias 28 e 29 de fevereiro, em troca de votações tranquilas de medidas provisórias e outras propostas até lá. A proposta foi recusada pela liderança do governo, que insistiu em pautar a votação do fundo para hoje. “O desenrolar de hoje caracteriza a intransigência do governo de ouvir o bom senso, de ouvir o razoável. Perdemos o dia. Hoje perdemos a PEC 270. Perdemos a posição de uma medida provisória que poderia convergir para o entendimento. Quem ganhou? A intransigência?”, questionou. O deputado Nelson Marchezan Junior (PSDB-RS) disse que o governo já inicia o ano com “truculência”. “Ontem, na reunião de líderes, todos acordaram que essa matéria seria votada no final de fevereiro. De repente, o líder do governo orientou que o presidente deveria colocá-la em votação hoje, e azar dos outros líderes de todos os outros partidos”, condenou.
PEC 270 vira moeda de barganha do governo para votar previdência complementar - Apesar de haver um acordo de líderes para votação da PEC 270/08 ontem, a inclusão de última hora do projeto de criação da previdência complementar do servidor na pauta da Câmara acabou impedindo a votação da proposta da deputada Andreia Zito (PSDB-RJ), que garante salário integral com paridade aos servidores aposentados por invalidez permanente. “Foi vergonhosa a atitude do governo! A PEC 270 virou moeda de barganha para o governo colocar em votação a previdência complementar. Mais uma vez, vemos o Executivo determinando a pauta do Legislativo”, protestou Andreia Zito.
Mesmo com apelos de líderes de diversos partidos, incluindo alguns da base do governo, o presidente da Casa, deputado Marco Maia, e o líder do governo, deputado Cândido Vaccarezza, decidiram encerrar a sessão sem votar a PEC 270 e o PL 1992, do Executivo, que cria a previdência complementar do servidor público. A votação dos dois textos foi remarcada para a próxima terça-feira (14/2). “A estratégia, na terça-feira, será a mesma, ou seja, colocar o PL 1992 junto com a PEC 270 para forçar a aprovação dos dois. Essa atitude vergonhosa mostra que diálogo não faz parte da política do governo. Quem paga o pato é o povo brasileiro”, acrescentou a deputada.
Contrariado, presidente da Câmara breca votação - O presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS), entrou ontem em rota de colisão com o Palácio do Planalto. O parlamentar queria o direito de escolher e indicar um nome de sua confiança para a cúpula do Banco do Brasil. Apesar das promessas, o governo voltou atrás e não lhe conferiu essa atribuição.
Sem a nomeação, o petista encerrou abruptamente ontem a sessão da Câmara e não pôs em votação o projeto que cria o Fundo de Previdência Complementar dos Servidores Públicos Federais (Funpresp). A previsão é que a proposta seja votada apenas na próxima terça-feira.
Maia ficou particularmente irritado com a contraproposta feita pelo governo de incluir na sua cota um cargo no BB de Angola. Aliados confidenciaram que Maia teria considerado a proposta "uma ofensa". Numa conversa áspera pelo telefone com a ministra de Relações Institucionais, Ideli Salvatti, ele expressou seu descontentamento. Aborrecido, Maia desligou o telefone na cara da ministra.
A presidente Dilma Rousseff estava decidida a fazer um teste ontem na sua base de apoio na Câmara na votação do projeto que cria o fundo complementar para os servidores. Por isso, havia determinado a aprovação da proposta. O projeto, no entanto, enfrenta resistências dos aliados e, segundo líderes partidários, a presidente avisou que queria saber "quem realmente está com o governo". O recado do Planalto foi dado pelo líder do governo na Câmara, Cândido Vaccarezza (PT-SP).
Com o fim da sessão e sem nenhuma votação, Vaccarezza foi chamado às pressas ao Planalto para explicar o que aconteceu. Em dezembro, o Funpresp também não foi votado porque Maia preferiu adiar a análise da proposta para fevereiro. Depois da recusa do governo em indicar um nome de sua confiança, Maia não fez nenhum esforço para que a proposta fosse votada.